7.10.04

Divina Tragédia (canto I) - O Quinto dos Infernos

Meu nome é Nivronzky. Na verdade é Michaetch Mahukutaefail Wladisknivronzky dos Santos. Mas as pessoas me chamam de Nivronzky. Chamam-me de outras coisas também. Mas eu não respondo. Sou detetive particular. E moro no Inferno.

Não. Não é uma forma de expressão. Moro realmente no Inferno, junto com outras almas penadas. No Quinto Círculo, mais precisamente. Este Quinto Círculo é terrível: igualzinho a São Paulo, só que sem os cinemas e administrado permanentemente pelo Pitta. O Sexto Círculo é pior: idêntico a Mogi das Cruzes. O Sétimo, Nova Déli. O Oitavo é uma Brasília com semáforos. O Nono nem queira saber. Em todos faz muito calor. Muito calor mesmo.

Derramava minha transpiração num copo quando Jorginho Guinle, meu novíssimo secretário, entrou em meu escritório. Veio entregar a correspondência. Sim, aqui no Inferno os Correios também existem mas entregam somente malas diretas e contas vencidas e com multas. Os Correios foram privatizados no Inferno, assim como todos os demais serviços públicos. O serviço piorou bastante mas agora eles nos cobram uma tarifa extra pelo aumento da ineficiência.

– Sr Nivronzky, há um crime a ser investigado no Paraíso. - disse Jorge Guinle.
Ele fazia visitas freqüentes ao Paraíso pra comer a Greta Garbo. – Assassinatos em série - completou.
– Sim? E eles precisam da ajuda de uma cabeça brilhante como a minha? - Perguntei enquanto enxugava o suor do cocuruto.
– Não. Mas achei que gostaria de saber.

Tentei me informar sobre esses assassinatos nos jornais e na TV. Mas os únicos jornais do Inferno são edições atrasadas d'O Rascunho e cadernos de classificados de imóveis. Na TV com chiado há apenas os eternos programas de auditório em todos os canais. E propaganda eleitoral.

No Inferno os celulares não falam, só tocam a musiquinha irritante. Muito alto e o tempo todo. Quando você atende ele desliga. A telefonia fixa no inferno consiste em apenas e tão somente dois orelhões. Desta forma os habitantes, depois de enfrentar filas de vários quilômetros para telefonar, devem ainda torcer para que a pessoa com que ela deseja falar tenha chegado ao outro orelhão no mesmo momento. Outro meio popular de comunicação é a Infernet, versão infernal da Internet. Porém todos os emails são spams e contém vírus perigosos que podem transformar seu computador numa gosma quente e pegajosa em segundos. Isso explica porque a única forma de comunicação utilizada com êxito no Inferno é o grito.

Eu tenho licença para sair do Inferno de vez em quando. Fiz questão de colocar no meu contrato. Por isso recomendo sempre negociar a danação eterna de sua alma enquanto você ainda está vivo e não deixar para prestar atenção nesse detalhe quando for tarde demais. O meu contrato é o Golden-Master-Plus-Hot-Hot-Hot com Lesbian-chics. Foi uma boa escolha.

Resolvi então gastar minha folga secular prevista em contrato. Para ir ao Paraíso são necessárias dezessete conduções. Todas lotadas. O trânsito estava infernal, como é de praxe no Quinto Círculo.

Decidi ir de Jegue. Mas antes eu precisava passar no meu traficante.