28.4.06

O menino que tinha um pato grudado na orelha direita

para Antoniete

Os médicos dizem que as possibilidades são muito remotas. Algo como uma chance em cinco trilhões. Mas ele dera muito azar. Nascera com um pato grudado na orelha direita. Um patinho meio desbotado, as penas cinzas todas eriçadas, com carinha de patinho injuriado. As crianças tiravam sarro na escola. Olha lá o cabeça de pato. Cuem-cuem! Cuem-cuem! Virou seu apelido. Cuem-cuem. Crianças são maldosas como só seres puros e inocentes conseguem ser. Cuem-cuem começou a andar com um chapelão de aba larga que pegara emprestado com seu pai, que era gigolô de cinema americano da década de 70. As crianças, então, passaram a chamá-lo de Cuem-Cuem Chapelão. E Cuem-Cuem Chapelão passou a não mais tirar o chapelão de feltro preto com lantejoulas e alimentava o pato escondido por debaixo da aba, porque muito pior que ter um pato grudado na orelha é ter um pato morto grudado na orelha. Mas a Natureza é mesmo uma coisa espantosa, linda, sábia e gostosuda. Certo dia de muito calor e luminosidade, Cuem-Cuem Chapelão retirou o chapelão que lhe cobria a cabeça, olhou-se no espelho e viu que, miraculosamente, o pato em sua orelha direita desaparecera. Grudado em sua cabeça agora estava um belo e majestoso cisne branco.