6.6.06

Desvendando o Código Brecheret (parte II)

Capítulo 4

Um homem careca aponta para uma das salas da Pinacoteca. "Ei, venham por aqui!". Professor Epaminondas e Buluca fogem do árabe assassino por um túnel escondido atrás de um quadro de Benedito Calixto, e vão seguindo a passos rápidos o misterioso homem careca. O túnel termina em uma cela do DOPS do outro lado da avenida. "Ei, você não é o Vladimir Herzog?" "Sim, sim, fui eu que construí este túnel. Mas não tenho tempo para explicar agora. Venham por aqui, entrem nesse rabecão do IML e se escondam debaixo dos corpos de supostos membros do PCC ainda não autopsiados ." "Mas… mas…" "Isso não é hora de frescurinhas! Entrem logo!".

Professor Epaminondas desconfia que Vladimir Herzog estava a lhe preparar uma armadilha e imagina que o velho comunista deseja apenas lhe roubar a sua estranha chave. Professor Epaminondas bate com um pesado busto de Erasmo Dias na cabeça de Herzog e foge adentrando pela estação Luz do metrô, arrastando a assustada Buluca pela mão. Justo a tempo, pois o árabe assassino acaba de sair do túnel procurando a dupla.

Capítulo 5

No metrô, ao examinar a estranha chave, Professor Epaminondas verifica que nela há um pequeno Abaporu entalhado. Começa então a divagar sobre a Semana de Arte Moderna de 22. Explica a Buluca que o famoso grupo modernista era, na verdade, a reconstituição de uma antiga Ordem secreta, como bem representara Victor Brecheret no monumento "Deixa que eu empurro". Villa-Lobos cifrara os estatutos da Ordem em suas Bachianas. Professor Epaminondas já girara vários LPs de Villa-Lobos ao contrário para confirmar a teoria e conseguira compilar uma série mensagens deixadas pelo famoso maestro, mas que faziam ainda pouco sentido: "Ele voltará, ele voltará", "Mussum is dead, daddy too", "Mario é um homossexual enrustido" e "Você está estragando a sua vitrola, imbecil".

Depois de tomar o caminho errado três vezes e fazer várias baldeações, que involuntariamente acabaram despistando seu perseguidor árabe, o Professor Epaminondas e Buluca acabam descendo na Estação Sé do metrô. "Venha. É por aqui que a chave se encaixa" "Como o senhor sabe, professor?" "Elementar, minha cara Buluca, leia novamente as instruções de seu tio: o importante líder zapatista é o comandante Marcos. E a nota dada à administração Kassab é zero. Naturalmente, Marco Zero." "Oh, professor, o senhor possui uma mente tão avantajada" "Sim, sim, querida Buluca, avantajada, intumescida e latejante. Você teria uma aspirina, por acaso?"

Em cada uma das facetas do Marco Zero em frente à Catedral da Sé há uma figura diferente. Uma delas é a de um navio. Professor Epaminondas consegue encaixar a estranha chave na figura náutica. Ao girar a chave, ouvem um barulho de pedras raspando. A fonte da praça começa a jorrar e o pedestal se abre revelando uma passagem secreta conduzindo uma antiga escadaria em espiral.

"Os Guardiões do Estandarte!", murmura o professor. "Como, professor?" "Os Guardiões do Estandarte de Antônio Conselheiro!", repete o catedrático enquanto desce as escadas ilumindando-as com um lampião a querosene que costuma trazer sempre no bolso para estas ocasiões. "Estas, Buluca, são as Perdidas Catacumbas da Sé!!"

Capítulo 6

"Professor, não é estranho que a reconstrução da Catedral da Sé, a total reforma da Praça na década de 70 e as obras da estação do metrô que passa exatamente aqui em baixo jamais tenham revelado estas misteriosas catacumbas dos Guardiões do Estandarte?" "Deus escreve certo por linha tortas, Buluca" "O que isso quer dizer, professor?" "Que Ele fez um bom curso de caligrafia."

Nas Catacumbas da Sé eles encontram diversos nichos nas paredes, são sepulcros com os corpos preservados de José de Anchieta, Manoel da Nóbrega, Oswald de Andrade, Jimmy Hoffa, Dana de Tefé, Vigilante Rodoviário e seu cãozinho Lobo. Todos eles perfeitamente embalsamados, excetuando Jânio Quadros, que foi preservado em álcool. Cada um deles carregando estranhas relíquias em suas mãos. Nas mãos de Pagu, o pênis embalsamado de Samuel Weiner. Nas mãos de Carlos Lacerda, os fundilhos do pijama de Getúlio. No último nicho está Ariano Suassuna. "Uai, professor, esse aí não está vivo ainda?" "Não, querida, este é… o verdadeiro e único… Antônio Conselheiro. Aquele velho que você chama de Ariano Suassuna é apenas uma réplica feita pelos Os Guardiões do Estandarte, que simplesmente a utilizam para confundir as pessoas..." "Como assim confundir? Não estou entendendo." "Não está? Viu como está funcionando bem?"

"Canudos, na realidade, nunca existiu. Bem, existiu, mas não da forma com que está contada nos livros. Os Sertões é simplesmente uma obra de ficção de Euclides da Cunha que procurou propositalmente denegrir a imagem de Canudos. Uma cortina de fumaça. Euclides foi contratado pela família Mesquita que comandava o jornal A Província de São Paulo, o antigo nome do Estadão, para inventar uma história fantástica e absurda para acobertar a verdade sobre Antônio Conselheiro. E, como Almeida Júnior, Euclides da Cunha morreu assassinado pelo amante de sua mulher." "Não era o contrário, professor?" "Não. Tenho certeza que ele não matou a mulher. Foi o Euclides, mesmo. Uma clara queima de arquivo".

"Ocorre que o verdadeiro Antônio Conselheiro era um homem muito culto, educado em Coimbra, um sábio de muitas posses e cursos de alquimia nos sete Egiptos, sétimo dan nos Roscrucis, na maçonaria chegou a títulos inéditos como Baluarte do Umbral de Alcácer-Quibir, Grão-Mestre-de-Cerimônias do Quinto Evangelho Adormecido, Protetor do Terceiro Segredo de Évora e dos pasteizinhos de Santa Clara, este último título decidido nos pênaltis. Porém, no auge de sua carreira de eminência-parda, Antônio Conselheiro decidiu largar tudo, deixou o cabelo crescer, passou a usar chinelão, começou a se interessar por cromoterapia e cristais, resolveu viver a vida de pés para o alto e criar uma comunidade alternativa em Trancoso, no sul da Bahia. Mas por quê? O que teria ocasionado esta mudança tão radical? Alguns estudiosos acham que era um mero despiste para poder guardar um Segredo tão terrível que nem o ápice da pirâmide maçônica poderia saber. Outros pesquisadores crêem que foi exagero na mescalina mesmo. De qualquer modo, como lhe teria sido revelado pelas ciências arcanas que o sertão iria virar mar e o mar, sertão, ele decidira não fazer sua pousada à beira-mar e sim bem no meio da caatinga. Outras pessoas a ele se juntaram e montaram suas barraquinhas de artesanato e suas plantações de maconha. Alguns trouxeram cocaína da Bolívia (daí o nome Canudos). Antônio Conselheiro construiu sua pousada, toda branca, estilo mediterrâneo, e ficou lá, sentado em sua cadeira de balanço, esperando o marzão chegar."

Professor Epaminondas continua dissertando enquanto ilumina os mártires Guardiões do Estandarte com seu lampião. "Porém, quem chegou em Canudos foram os canhões do exército republicano que acabaram por destruir completamente a comunidade alternativa de Conselheiro, sem que conseguissem encontrar o seu segredo mais secreto, que permanece oculto, escondido e desaparecido até hoje."

Buluca retira das mãos do embalsamado Antônio Conselheiro um cartucho cilíndrico com os seguintes dizeres: "Atenção. Contém documento super-hiper-secreto. Não deve ser lido por ninguém nunca sob nenhuma circunstância em absolutamente nenhuma hipótese" "Parece ser importante, professor" "Hmmm, talvez, quem sabe?"